Começar

Não fazia muito tempo que eu havia encontrado o aconchego do meu lar, em meio às sombras da floresta. Era uma cabana simples, eu não precisava de muito para ser feliz. Os acontecimentos de minha vida tem sido sufocantes, eu precisava de nada mais do que eu mesmo nesse momento, a paz de estar comigo. Por isso eu me esforcei o máximo que podia para construir meu lar, onde agora eu sinto que pertenço. Pertencer, gosto dessa palavra.

Nunca me esqueço daquele dia, era primavera, o cheiro das folhas, flores e das árvores me acalmavam, preenchiam meu ser, os pássaros cantavam e em meio à suas melodias eu despertava alegre.

Fazia um tempo que eu podia ouvir um caminhar diferente, não era o mesmo barulho que eu estava acostumado, mas seja qual criatura fosse, não estava pronta para se apresentar. Ao final da tarde, o sol já estava distante no horizonte e poucos raios de luz passavam entre as árvores. Foi quando o vi pela primeira vez, a silhueta de um cervo, majestoso e imponente contra à luz, parecia um ser de outro reino, prestes a tomar conta do mundo.

Nos observamos por um longo momento, então ele se virou com calma e seguiu seu caminho, me perguntava o que era aquela sensação de reconhecimento, como se fossemos velhos amigos.

As sombras da noite tomaram conta de todo lugar e eu estava em minha cabana, sai dela para apreciar a noite e acender uma fogueira, dava para enxergar a lua entre as folhas das árvores. Ao ouvir o som do farfalhar no horizonte eu já reconhecia sua forma de caminhar, ele havia voltado. Me espantei quando vi uma silhueta de um homem nu e com chifres, ele estava parado a poucos metros de mim. Não sabia se disparava sem destino ou permanecia parado, mas de alguma forma eu sentia que ele não me oferecia perigo.

Ele se aproximou lentamente e próximo da luz da fogueira eu consegui ver seu rosto, que era uma mistura de humano com animal, ele me lembrava o cervo que havia visto mais cedo e dentro de mim, eu sabia que eram o mesmo ser. O Homem Cervo se sentou em um tronco na frente da fogueira, estávamos quase de frente um para o outro. Então ele me contou uma história, que eu nunca imaginei que já reconhecia.

O Homem Cervo me contou sobre seu grande amor, perdido no horizonte de sua vida, um amor que lhe foi tirado há um longo tempo atrás, quando uma antiga magia tinha lhe transformado no que era hoje. Ele era na verdade, uma mulher, antes de se tornar um animal da floresta.

E eu já a conhecia intimamente, eu nunca a esqueci e descobrir que ela estava exatamente onde encontrei meu lar, só me fazia pensar em como nos encontraríamos pelo resto de nossas vidas, não importava como. Meus olhos lacrimejavam, lágrimas escorriam de meu rosto enquanto eu o ouvia falar sobre tudo aquilo que eu já sabia dentro de mim, sobre todos aqueles momentos que eu nunca havia esquecido.

Ele terminou dizendo que não poderia ficar, que não nos pertencíamos mais, não daquela forma, mas que me observaria e me protegeria pelo resto de sua vida. Nos abraçamos, um longo abraço. E então o Homem Cervo partiu para as sombras da noite, de volta para seu reino animal.

Até hoje nos amamos à distância, e eu sempre me pergunto quando poderei abraçá-lo novamente, na esperança de lhe beijar.

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