Começar

Ele caminhava esgueirando-se entre as sombras das árvores. Ele não gostava daquela meia luz, isso o irritava um pouco! Adorava a noite. Com seu cabelo roxo, seu manto preto e seu sorriso lunático, ele caminhava com sua flauta feita de madeira, que sempre carregava em seu cinto, mas, nesse momento, não estava no seu cinto, pois agora estava em seus lábios tocando sua melodia. Não era uma melodia qualquer, tampouco tocava por qualquer motivo. Seus olhos estavam atentos por trás de sua máscara, que cobria irregularmente somente uma metade de seu rosto. Ele lembrava um palhaço, um palhaço muito sádico que estava prestes a aprontar algo.

Será que alguém o ouviria? Era melhor mesmo que o ouvissem! Sua flauta não tocava para o silêncio dos inocentes! Tocava para silenciar esses falsos inocentes que a ouvissem. E eles ouviriam. Ah se ouviriam!

Rupter era seu nome, e hoje Rupter conquistaria seu reconhecimento no meio dos que vivem na sanidade de uma vida insana. Talvez eles não o aplaudissem, era muito provável que eles se espantassem. Mas ele não se importava, no final daria um show para todos eles!

Enquanto caminhava, seus olhos rodopiavam pensando em sua melodia, sentindo sua melodia. Seus dedos não paravam, havia fôlego suficiente para horas de música. Seu caminhar era acompanhado de pequenos saltos, no ritmo da melodia. Parecia feliz. Não, não só parecia, estava feliz! Prestes a encantar aquele ser indefinido, aquele ser curioso... Afinal, o que era aquilo? Ah! Não importava o que era!

Seu corpo arfava, isso não afetava sua música, é claro, mas arfava. Estava se aproximando... Estava ansioso, como estava ansioso! A silhueta no horizonte já podia ser avistada. Rupter já reconhecia aquela silhueta, aquele ser estranhamente bonito... Hoje ele reconheceria seu poder! Hoje! Hoje!

Ele sabia seu nome - Nory, um nome tão estranho quanto era esse ser, curioso, engraçado. Nory não se virou enquanto Rupter se aproximava, esse serzinho aprenderia a não ignorar sua música! Não demoraria muito, não... Já devia estar afetando Nory. O ser encontrava-se paralisado, paralisado! Mas seu corpo começou a cambalear com a melodia e Rupter dançava em volta dele, sorridente, lunático e sádico. Queria dizer umas coisas para esse Nory, ou essa Nory, Nory estranho! Mas sabia que não poderia parar de tocar. Não agora.

Nory estava em transe, lhe pertencia agora, não tinha mais volta. Era o momento de se sentar no chão, cruzar suas pernas e começar o ritual da lembrança. Rupter começou a pensar em todas coisas que queria que esse Nory pensasse, ficaria tudo rodopiando em sua mente. Rodopiando! Os pensamentos fluíam com o ritmo de sua melodia, dançavam. Ah, sim! Rupter conseguiu o que queria, Nory não se lembraria de nada, ou quase nada! O que restou eram os pensamentos que Rupter queria que Nory pensasse. Sussurros, sussurros...

A melodia havia acabado, junto de seu ritual, Rupter se levantou. Nesse momento um homem saiu do meio das árvores e disse para ele “Muito bem, Rupter”. Rupter não conseguia conter suas gargalhadas, era tanta felicidade! Com seus olhos arregalados, feliz por ter tocado sua música. Parou com os pés juntos e fez uma reverência exagerada, digna de sua apresentação, encerrando seu show.

Rupter partiu. Dessa vez a sua flauta de madeira que estava em seus lábios, não estava mais, pois havia voltado para o seu cinto. Ele caminhava mais sério, assobiando, como se fosse dono daquela floresta. Gargalhando! gargalhando… HAHAHA!

Todos Capítulos